Dobrar como dobra Jeanne Dielman o caos nas pernas unidas de umas calças de pijama ou nas mangas bem achatadas de uma camisa. Envolvê-lo no metódico ritual de panar uns bifes de vitela. No final dos dias deixar tudo pronto para o retomar da mecânica salvífica. Deixar entrar uma brecha de ar, um chilrear de pássaros ao amanhecer, ameaçando profanar a perfeição das dobras. Uma tampa de uma terrina que se deixa aberta pela primeira vez: a hesitação como maneira, um certo arrastamento dos gestos que paira, como que prestes a substituir o anterior rigor. Fazer café é uma cerimónia em nome de um prazer indeterminado. Sair dos eixos. A irrupção do caos: as batatas que se deixa queimar, o botão do robe que se esquece de abotoar, o cabelo que se deixa despentear, o talher que se deixa cair, o orgasmo proibido, a punição de um culpado.

 


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